No cenário mundial, entre primeiras ministras e presidentas, há líderes mulheres em 19 países atualmente, representando em torno de 10 % dos governos mundiais, sendo nove países na Europa com liderança feminina, três países na América do Sul, dois países na America Central, dois países no Continente Africano e dois países na Ásia.

E o cenário nos EUA está prestes a integrar esta lista. Se em 2007 o país tinha como pré-candidatos à presidência pelo partido Democrata, um negro e uma mulher, para 2016 há duas mulheres pré-candidatas à presidência, uma pelo partido Republicano (a ex-presidenta executiva da Hewlett-Packard – HP, Carly Fiorina) e uma pelo partido Democrata (Senadora Hillary Clinton).

Em 2007, a disputa foi acirrada entre Barak Obama e Hillary Clinton para concorrer à presidência pelo partido Democrata. E este fato já nos aponta importantes mudanças na sociedade e na política dos EUA. Pela primeira vez na história norte-americana um negro se tornou Presidente.

E o que esperar para 2016? A primeira mulher a comandar a Casa Branca?

Teremos que esperar para ver. O que podemos analisar até aqui é a presença das minorias na política, mais especificamente, a presença feminina na política e na concorrência do mais alto cargo dos Estados Unidos e o que isso pode refletir na busca pela equidade de gênero, ou seja, em que mulheres e homens tenham iguais direitos, deveres, oportunidades e reconhecimento social e politico.

De um lado temos Carly Fiorina, com histórico executivo em empresas, com conhecimento em economia, negócios e novas tecnologias. De outro, Hillary Clinton, com histórico de ex primeira-dama ativa na política, senadora e secretária de Estado. Duas mulheres que, em suas trajetórias, demostraram já terem conquistado espaço e notoriedade em universos prioritariamente masculinos.

Na história dos EUA, entre os anos de 1872 e 2012, houve treze pré-candidatas e/ou candidatas mulheres para a presidência e cinco candidatas à vice-presidência. Victoria Claflin Woodhull foi a primeira mulher a concorrer à presidente dos Estados Unidos em 1872. E Shirley Chisholm Anita foi a primeira mulher negra a buscar uma importante indicação do partido para a presidência dos EUA em 1972.

Ao abordarmos mulheres na política, há três aspectos a serem problematizados: direitos, competências e representação social e política, sob a perspectiva de que vivemos em uma sociedade patriarcal e machista, mesmo dentre alguns importantes avanços na sociedade ocidental. Assim, há de se considerar o processo socializador e as relações de gênero entre os sujeitos envolvidos.

Ao entendermos o conceito de gênero como um elemento constitutivo das relações sociais pautadas nas diferenças que distinguem os sexos, considera-se que, embora gênero não seja o único campo onde se articula o poder, é a primeira instância dentro da qual são articuladas tais relações, atreladas a outras questões sociais, políticas e históricas. E ao considerarmos os estudos sobre configuração social, o cerne está em compreender o movimento das forças vetoras entre os processos relacionais, na busca de elucidar como ocorrem os jogos de negociação e as relações de poder (Joan Scott,1990; Norbert Elias, 1970).

Mulheres na política

E para compreender as mulheres na política e a busca por seus direitos, há de se considerar também a representação feminina na sociedade, e as relações de poder e jogos de negociação nos quais está inserida. No cenário ocidental, há importantes conquistas feministas na sociedade e na política, como: direito ao voto; formação acadêmica em áreas e cursos prioritariamente masculinos, conquista de cargos de chefia em empresas e serviços públicos, novas configurações familiares; ampliação das políticas públicas para a equidade de gênero e sexualidade, dentre outros.

Se desde o século XIX o movimento feminista vem se ocupando de uma atividade política mais ampla, na década de 60 trouxe questões de caráter político específico, como, por exemplo, a denúncia da submissão feminina perante a opressão masculina. Desta forma, assumiu-se o caráter histórico e político interessado na construção social das mulheres (LOURO, 1998). No século atual – XXI, têm-se importantes acontecimentos que vem convergindo com a luta feminista, direitos humanos e direitos LGBT no mundo.

Entretanto, a busca pelos direitos equitários de mulheres e homens tem um longo caminho pela frente. A concorrência à presidência de duas mulheres para a Casa Branca irá, por certo, favorecer este árduo caminho de reformulação de paradigmas. Espera-se que ditos como “Mulheres são melhores em cuidar da casa e da família que tomando decisões estratégicas, econômicas e de guerras mundiais” façam parte do passado em breve. Da mesma maneira, espera-se que tal presença duplamente feminina nas eleições norte-americanas venha a contribuir para que a credibilidade das mulheres esteja pautada em seus atos e resultados, e não em sua forma física ou hábitos de beleza. O que nos conecta ao item seguinte.

Ao tratarmos de competência das mulheres para cargos de chefia em empresas, serviços públicos e lideranças governamentais, compreende-se que, por conquistas educacionais, sociais, históricas e políticas, as mulheres também vem ampliando seu leque de competências e habilidades em outras áreas, não somente aquelas representadas como sendo do universo feminino (casa, família, profissões pautadas em cuidado e ao mundo privado) e, com isso, ganhando espaço no mercado e na sociedade.

A presença feminina na Casa Branca tende a, valorosamente, apontar a competência de uma mulher em estar no comando de uma potência mundial, independente da estética e da vida pessoal (família), comentários comuns à mulheres em destaque de liderança. A normatividade masculina e patriarcal na sociedade ocidental aponta as mulheres ligadas à aspectos de beleza, cuidado, fragilidade emocional e física; enquanto conserva aos homens aspectos de inteligência, força e lógica.

Espera-se que o reconhecimento profissional e de liderança promova que não mais convivamos com a realidade de que mulheres ganham 30% a menos que os homens nos EUA e na vasta maioria dos demais países. Importante considerar que tais relações entre homens e mulheres são pautadas em jogos de poder, que por sua vez convergem com o pensamento de que diversidade social e a atuação na política muitas vezes enfrentam interesses e benefícios de grupos considerados ‘dominantes’.

Interligado aos direitos e às competências das mulheres, estão a representação social e política. Historicamente pautada em estereótipos e em construções culturais da identidade feminina, a representação das mulheres tende a ressaltar que todas as mulheres são iguais, ao invés de considerar as distintas identidades construídas que diferenciam as mulheres entre si (e os homens entre si também).

Da mesma forma, embora alguns avanços, ainda há um arcaísmo de sub-representação das mulheres na sociedade e na política. Como se, pelo fato de ser mulher, a profissional já carregasse um status mais baixo que seus colegas homens. A luta é diária e as conquistas acontecem aos poucos. Aquela máxima “Só podia ser mulher no volante”, também é muito utilizada nos cargos de liderança.

Quando os resultados não são o esperado, muito se ouve “Só podia ser mulher”, “Deve ser mal amada”, “Deveria estar na cozinha e não no governo”… Ou seja, nada argumentando sobre a competência ou as estratégias profissionais tomadas e, sim, ressaltando características pessoais e de gênero, com o intuito de julgar a sua competência na atuação social ou política.

Carly Fiorina e Hillary Clinton, na pré-candidatura à presidência dos EUA, tem um longo caminho pela frente, mas já demarcaram a luta pelos seus direitos (e os direitos das mulheres em geral), mostraram a competência profissional em suas áreas e as conquistas adquiridas, mesmo à frente de representações reducionistas das mulheres. Rumam para o enfraquecimento da bipolaridade (homem vs. mulher) e da hierarquia entre a maioria dos homens frente às mulheres. Considerando que qualquer relação social é feita de tensões, concessões e negociações, o que se espera é que as relações entre homens e mulheres possam acontecer sob os pilares de equidade social e politico.

Casa Branca e o mundo merecem assistir a disputa entre as duas pré-candidatas. Casa Branca e o mundo devem considerar este fato como uma reformulação de paradigmas. Casa Branca e o mundo, gostando ou não, estão à frente de duas mulheres poderosas, inteligentes e capazes de marcar a história. E os espectadores, sejam mulheres ou homens, devem dar o passo ao lado, despir-se dos pré-conceitos, e reconhecerem que o que deve estar em jogo são as competências profissionais das duas, e não a roupa ou o penteado que vão usar no dia da posse.

ana-paula-defton

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *