É comum me deparar com influenciadoras do meio materno relativizando discursos científicos para justificar e validar suas próprias escolhas, ao invés de usarem seu espaço e voz para amplificar debates tão importantes e relevantes como alimentação, telas, saúde e outros.

Minha provocação, desde que comecei a estudar e falar sobre maternidade, há cerca de 5 anos é justamente a dificuldade que temos de diferenciar opinião de análise científica, análise científica de ataque pessoal e ataque pessoal de opinião. Tanto para receber como para dar.

Qual a diferença entre opinião e evidência científica? Qual a diferença entre reconhecer a não neutralidade da ciência e dos meios de comunicação e o relativismo e negacionismo?

 

E por que nós adoramos proclamar a ciência quando nos convém, mas relativizar quando é algo que não conseguimos cumprir à risca?

 

Para ilustrar meu ponto, vou pegar como exemplo o caso do açúcar propondo uma reflexão não apenas sobre maternidade e feminismo, como, principalmente, sobre protagonismo.

Hoje temos muita informação sobre os malefícios do açúcar, em especial quando administrado antes dos dois anos, mas não apenas. Já se sabe que o açúcar é mais viciante que a cocaína e que ele impacta diretamente no sistema cerebral de recompensas. Cientistas chamam o açúcar de “o novo cigarro” e a indústria está cada vez mais acuada.

Existem estudos que minimizam e relativizam os efeitos, que defendem o “equilíbrio”, mas fuçando um pouquinho mais é fácil descobrir que são financiados pela indústria alimentícia, pelo agro, etc.

Troque açúcar por qualquer coisa e a conclusão é a mesma: capitalismo sucks bebê e não é de hoje também né?!

Agora, vamos lá, doce é sinônimo de afeto, de recompensa! Doce é sinônimo de infância só que, na verdade, tudo isso é hábito e culturalmente apreendido.

Isso quer dizer que eu (ou meu filho) não como açúcar? Não!

Isso quer dizer apenas que eu não vou chegar aqui e falar que tá tudo bem porque EU faço algo! Ou que eu posso queimar pesquisa e dizer: “ahh tá tudo bem desde que…”

Isso também não quer dizer que eu estou falando o que você deve ou não deve fazer ou dar, aliás, você dificilmente vai me ver falando algo que uma mãe DEVE ou não fazer (a não ser assumir as rédeas da sua própria vida, porque isso eu falo mesmo!).

 

Mas aí vai uma coisa que pessoas que influenciam milhares de outras realmente não deveriam fazer: dar opinião anticientífica como se não fosse uma opinião. Você não é obrigada a NADA: liberte-se da culpa! Culpa não contribui para NADA!

 

 

Agora, libertar-se da culpa NÃO É sinônimo de JUSTIFICAR e, muito menos, de NEGAR FATOS.

Sim, porque estamos em 2019 e as mães seguem se torturando por escolhas (conscientes ou não) ao invés de assumirem a responsabilidade por suas decisões (inclusive a falta de) e, com isso, se sentem na obrigação de se justificarem para o mundo criando um filme de autoengano em sua cabeça.

Aí chega a fada sensata e diz: “ta tudo bem amiga, pode dar açúcar” ou “suas loucas irresponsáveis, como vocês deixam seus filhos verem tv?!” (inclua aqui a escolha que divirja da dela!) e isso é sim, bem irresponsável!

 

Então, como diria Bela Gil, você pode substituir o “tá tudo bem” por: “nós fizemos tal coisa, assumimos o risco e, para a nossa família, foi a melhor opção, mas sugiro que você pesquise sobre os malefícios do açúcar e tome a decisão que faz mais sentido para a sua realidade.”

 

O Ministério da Saúde adverte, mas as blogueiras infelizmente nem sempre.

Encontrar justificativas para nossas frustrações sem que tenhamos que assumir nossa parte nelas não ajuda a trabalhar a culpa, não fala sobre compartilhar responsabilidades, políticas públicas, estruturas capitalistas que impõe e pautam comportamentos e acessos, não traz nenhum tipo de proposta, nada!

Banquem suas escolhas amigas!

 

Troquem o “não consigo”, “não é bem assim”, por “não QUERO!”
Isso sim é o PODER!

 

Munidas de informação temos sempre a opção de não enxergar e de agir de maneira diferente. O livre arbítrio é um direito absolutamente intocável e LIBERTADOR!

Combater o discurso da culpa e a sua naturalização enquanto destino materno se tornou uma missão pessoal e em toda oportunidade profissional e pessoal que eu tive eu fiz isso e foi exatamente o que motivou a escrita do meu livro recém-lançado pela Editora Letramento: Gestar, parir, amar: não é só começar. O que você deveria saber – e o que você realmente sabe – sobre maternidade.

Então, este livro é sobre voltarmos para nós mesmas. Sobre encontrarmos a mulher que já fomos e a mulher que queremos ser. É sobre a mulher que podemos ser.

Ele é sobre a violência com que mulheres e mães são tratadas — muitas vezes simbólica e naturalizada como biologia e instinto —, sobre feminismo e sobre sororidade.

Ele é também sobre libertar-se de forma consciente e ajudar outras mulheres a fazerem o mesmo. Ele é sobre assumir as nossas escolhas e sobre tirar das nossas costas o peso que não deveria ser só nosso. É sobre compartilhar, sobre rede de apoio e sobre coragem. A coragem de falar o que, muitas vezes, não temos coragem de assumir sequer para nós mesmas. Ele é sobre lágrimas choradas e lágrimas engolidas.

Ele é sobre sonhos, sobre angústias, injustiças e medos. Meus e que também podem ser seus.

Ele principalmente é sobre alternativas para um mundo que não está legal do jeito que está e que não precisaria ser assim!

No fundo, ele é sobre esperança.

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